sábado, 24 de novembro de 2012

Elyzabeth

O coração do Diabo e o coração da Mulher batendo na mesma intensidade.
Seus pés iam para a rua com direção e sem destino. Um corpo Elyzabeth. Lábios beijados.
Uma mente conturbada. Paixões manchadas no muro.
Fugia ao fugir de si e chorava sem chorar o futuro.
Ela despertou sem intenção, o dia soava, porém o Sol era lâmpada aos olhos da mulher adormecida.
Apaguem o Sol. Faleçam o dia, pois a senhoria não pretende pular da cama, neste espaço seu, o ócio predomina agora.
Até os confins da noite passada passara cantando, o clube estava cheio de seres palpitantes, muitos de homens,e para sorte das garotas o calor exalava seu pecado, seria a noite do mal e do cumprimento de alguns pecados.
Cumprimenta-se o cavalheiro. Desvia-se os olhos. Umedece os lábios e suspira como fogo, qualquer bigode e cavanhaque era indício atracação de corpos, qualquer um poderia ser o pretendente a conceder seu sobrenome e fazer da puta uma senhora proibida. Nalivah, Malarie, Delis, Arina, Corine, Brigitte garotas efêmeras, mulheres de cristal, por supuesto, amantes por desejo.
Entre tantos vulcões, no mar de tanta lava, Elyzabeth rolava uma lágrima na estrutra de seu rosto, matematicamente planejado em plenos traços suaves em sua pele morena enfeitiçada, olhos figurados num poço de mel e como completo ondas de cabelo de castanho de castanhas selecionadas. Nas cordas vocais uma divindade.
Cantando. Encantando. Enfeitiçando. Abrindo feridas.
A puta já não era puta. Elyzabeth fizera-se dama do clube naquele ano de 57. A filha de um imigrante espanhol com a brasileira descendente de índios. Seu tempo era de 27 anos proclamados, recobertos pelo corpo de curvas estrelares. O coração ferido e o whisky preenchendo o copo, cowboy para congestionar o nervosismo rotineiro.
Precisava de um álibi. Brigitte terminava de vestir-se e Elyzabeth aquecia o dorso, descansava a voz e respirava pausadamente, o cigarillo queimando entre os dedos e tragado agora por seus lábios vermelhos e selvagens. Ao confrontar-se com o espelho via a si mergulhada em rios do passado. Amava aquele homem que agora pesava somente abandono.
Torturava sua mente em questões auto-destrutivas, me pertenço? o porquê de estar aqui?, para onde irei?.
Perdoe-me Elyzabeth. Ofereço-te o álcool e seu milagre. Essa dose, muitas doses culminam em palavras reis e frases rainhas. Os olhos pesarão, as pernas começam a tremer quando o equilíbrio desaparece, com esses dedos arranhará a própria face figuradamente, cortará as máscaras, arrancando-as suavemente.
A tal puta que já não é mais puta sangrava sensações melancólicas.
Laurine propietária do Clube tocara seu ombro e ressoava que a hora já era hora. Fantasiando um vestido vermelho feito para seu corpo, usando jóias, expondo sua pele à constelação. Começara com "Basin Street Blues", os cavalheiros se embaçavam, almejavam a notoriedade por aqueles olhos grandes, e reciprocamente tentavam, atentavam por seus olhos, exibiam-se como produtos importados ou de qualidade nacional certificada. Elyzabeth era mulher, clamada como garota. Exposta como diamante.
Um concerto Blues no Clube alimentado por Ela, e personagem descosturando o prazer do cantar. Era o preço para se viver da arte. Aos sábados, segundas e quintas o diamante do espaço cheio. Sextas, domingos, terças e quartas a mulher abandono semeando a velhice de processar o passado.
Aquilo mudaria. O cavalheiro de diamante surgiria no Clube por acaso, por preciosidade um tal poeta, regador dos jardins dos romances mais épicos, jardim em que Elyzabeth plantaria sua rosa sem temer cortar-se mais com os espinhos.
A mulher nada esperava naquele tempo em que as esquinas eram mágoas, em que o álcool um grito, vivendo pesos de personagens da própria mente. O show acabara todas as palmas aplaudiam, vociferavam as vozes, ecoavam os assobios, e um breve aceno e a chama do Obrigado bastaria até o esperar da próxima apresentação.
O whisky aguardava, o cigarro já tragado no palco, agora acendia outro e sentara-se para uma conversa com Brigitte e Corine, as garotas querem ser Elyzabeth, e partilhavam da bebida, contavam suas noites e em tons esperançosos citavam algum cavalheiro ou outro, eram garotas, garotas. Conselhos não são bons. Ela continha em teu silêncio e limitava-se ao dizer de viver intensamente, afinal eram garotas forçadas mulheres.
O tal poeta não aparecera naquela noite, Elyzabeth fugia para casa não tão distante do Clube. A mente confrontava e rememorava todo resto de noite do amor e abandono, o homem que partira sem resquícios levando seus pássaros e cores brilhantes.
Levantar na manhã seguinte seria difícil, é difícil. O sol é como uma lâmpada, apaguem o Sol. A tortura era no minuto do despertar, logo Ela sobreviveria uma vez mais.
O tal poeta aparecerá e todo o curso se movimentará em direção ao futuro transportando a mulher.
O coração do Diabo e o coração da Mulher batendo na mesma intensidade.

Um comentário:

  1. desde Penélope a tecer colchas inacabadas pelas ondas da eternidade, as mulheres intensas, por vias mágicas do sonho, vivem imersas na chegada do amor, o amor que um dia chega...

    ResponderExcluir